Poesia Portuguesa

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Poema Novas da Corte

As damas nunca parecem
os galantes poucos são
cousas de prazer esquecem
os negócios vêm e vão
nunca minguam, sempre crescem.
Não há já nenhum folgar
nem manhas exercitar
é tanto o requerimento
que ninguém não traz o tento
senão em querer medrar.

Mil pessoas achareis
menos das que cá leixastes
doutras vos espantareis
porque vê-las não cuidastes
da maneira que vereis.
Uns acabam outros vem
e uns tem outros não tem
e os mais polo geral
folgam muito d’ouvir mal
e pouco de dizer bem.

Se cá sois bem ensinado
cada feira valeis menos
e se mal sois estranhado
dous dias e logo vemos
ficardes mais estimado.
E vai isto de maneira
que na capela cadeira
d’espaldas tem escudeiros
e consentem-lh’os porteiros
estarem na dianteira.

Anda tudo tão danado
que o que menos merece
se mostra mais agravado
e d’homens que não conhece
é el rei emportunado.
E estes que Deos padeça
hão de cobrir a cabeça
perant’ele no serão
e só por isso lá vão
sem haver quem os conheça.

Bons e maus todos já trazem
os rabos alevantados
em lobas frisadas jazem
capuzes apestanados
pola ponta do pé trazem
contas e lenços lavrados
e da sala namorados
e nunca dizem de quem
e pousando em Santarém
são assi afidalgados.

Quem for muito comedido
e quem for josteficado
não será muito valido
quem for desavergonhado
será com todos cabido.
Não há homens de primor
nem quem sirva por amor
senão por ter e mandar
nem há quem queira lembrar
o proveito do senhor.

Quem tem renda quer poupar
e quem gasta bem o seu
não no podem comportar
hão-no logo por sandeu
e qu’é siso entesourar.
Os velhos são namorados
os mancebos acupados
os casados são solteiros
os fracos são mui guerreiros
e os clérigos casados.

Há cá poucas amizades
e grandes competimentos
custumam pouco verdades
servem-se muito de ventos
e cousas de vaidades.
Não lembra a ninguém rezão
senão só encher a mão
e passe por u puder
nem creais que bem fazer
faz ninguém se el rei não.

E se quer ir ter verão
algum cabo ou invernar
e d’alguns toma a tenção
cada um o quer levar
para onde tem seu pão.
Pois nisto não tem respeito
senão só a seu proveito
vede bem qu’aconselhar
farão num bom pelejar
ou em outro grande feito.

Cabo

Porque sei qu’esperareis
que vos dê novas de mim
vos dou estas qu’ouvireis
qu’estou são em Almeirim
da sorte qu’aqui vereis.
Nunca mais saí daqui
üa hora nem parti
de servir e d’aguardar
e acerca do medrar
tal m’estou qual me naci.

(Excerto)
De Garcia de Resende, estando el rei em Almeirim, a Manuel de Goios, que estava por capitão na Mina e lhe mandou pedir que lhe escrevesse novas da corte, as quais lhe manda.


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Poema Novas da Corte - Garcia Resende